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A LINHA TÊNUE ENTRE O DIREITO À DESCONEXÃO E O ADOECIMENTO MENTAL DO TRABALHADOR:
UMA ANÁLISE DA SÍNDROME DE BURNOUT
ao respeito dos limites de sua jornada de trabalho, consequentemente, seus
momentos de descanso e lazer.
Devo esclarecer que quando se fala em direito a se desconectar do
trabalho, que pode ser traduzido como direito de não trabalhar, não
se está tratando de uma questão meramente filosófica ou ligada à
futurologia, como a que nos propõe Domenico de Masi. Não se
fala, igualmente, em direito em seu sentido leigo, mas sim numa
perspectiva técnico-jurídica, para fins de identificar a existência de
um bem da vida, o não-trabalho, cuja preservação possa se dar, em
concreto, por uma pretensão que se deduza em juízo. Um direito,
aliás, cujo titular não é só quem trabalha, mas, igualmente, a própria
sociedade, aquele que não consegue trabalho, porque outro trabalha
excessivamente, e os que dependem da presença humana do que lhes
abandonam na fuga ao trabalho [...] (MAIOR, 2003, p.2)
O direito à desconexão objetiva preservar o momento de descanso
do trabalhador – tal como sua pós-jornada de trabalho, período de férias,
licenças, afastamentos, repouso semanal remunerado – fazendo uma
divisão bem clara entre horas de trabalho e horas livres, na qual suas horas
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livres, assim como o nome mesmo diz, sejam livres para serem usadas da
forma que o trabalhador entender melhor para si, sem intromissões de
seu empregador. Intromissões em forma de mensagens são bem comuns
em um mundo hiperconectado, mas, tal ação, quando fora do horário de
trabalho, ultrapassa a barreira que o direito à conexão visa criar, pois, em
um mundo tão conectado, se torna normal achar que não existem barreiras
ao se comunicar devido à facilidade da ação. Neto (2018, p. 79) afirma
sabiamente que “o direito à desconexão nada mais representa do que o
direito ao lazer e descanso, em oposição ao trabalho, de forma livre, privada,
sem qualquer interferência”.
A barreira que ele visa construir é uma forma de humanizar as
relações de trabalho, pois, assim como o empregador, o funcionário também
tem direito a não trabalhar em horário que não fora estabelecido em
contrato, a ter férias, a não ser demandado no repouso semanal remunerado,
licenças etc. Aliás, não há uma limitação jurídica na quantidade de horas de
trabalho em vão, pois, ao estabelecer jornadas de trabalhos – tais quais oito
horas diárias, jornadas especiais, jornadas de tempo parcial, escala 12x36
-–o legislador pensou na forma que as horas trabalhadas fossem justas para
ambas as partes da relação de trabalho.