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CONCEITO DE ASSÉDIO MORAL ORGANIZACIONAL: OS DIREITOS FUNDAMENTAIS AO TRABALHO,
À SAÚDE E AO MEIO AMBIENTE SAUDÁVEL NA TUTELA DA ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO
os trabalhadores experientes, não corresponde aos padrões objetivos de
“qualidade”, de modo que é preciso, também aqui, torturar o trabalho
bem-feito para que caiba na planilha. Chega a ser surpreendente perceber,
a partir da escuta na pesquisa empírica, que uma parcela significativa das
necessidades humanas ligadas ao trabalho, a que cabe ao Direito proteger,
diz respeito às condições para se poder fazer bem o seu trabalho e ser
reconhecido por isso. Embora se possa achar que “isso é justamente o que
a empresa também quer”, o que se tem visto é a implementação de um
modelo gestionário destinado a erradicar os valores e saberes do trabalho
com o fim de submetê-lo ainda mais a fim de aumentar a rentabilidade e
o domínio, mesmo que degradando qualidade do trabalhar e, no mais das
vezes, do próprio produto ou serviço . Nesse sentido, o uso de ferramentas
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de padronização do tipo ISO e outras, cujo conteúdo prescrito pode até
ser salutar, mas quando implementado de modo a substituir a ponderação
dos padrões normativos com o conhecimento sobre o real do trabalho pela
supervalorização do preenchimento dos resultados formais dos dispositivos
de controle dos padrões, pode produzir uma grave deterioração das
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condições organizacionais.
Paradoxalmente, como se referiu antes, a própria ISO vem de editar
a primeira norma de padronização global de gestão de riscos psicossociais no
trabalho, IS0 45003, com forte consideração dos elementos organizacionais,
sociais e ambientais como potenciais riscos, mas, na forma de “diretrizes”,
sem padrões quantificáveis. Trata-se do reconhecimento e de um excelente
referencial de como a organização do trabalho é central para a saúde psíquica.
Mas cabe também refletir como métodos de gestão tão influenciados por outras
normas “ISOs” podem ser agravantes dos riscos psicossociais e mesmo levar à
“loucura da norma”, pela supressão do espaço de autonomia interpretativa dos
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sujeitos diante das situações reais e complexas .
O quarto dispositivo envolve a imensa ampliação das formas de
precarização, em geral, criando formas contratuais subalternas, fragmentadas
54 DEJOURS, Le Choix. Souffrir au travail n’est pas une fatalité. Paris, Bayard, 2015.
55 DEJOURS, Christophe. Ce qu’il y a de meilleur en nous, op. cit., p. 61. Isto que pode ser
dito tanto de padrões normativos da organização do trabalho quanto também de uma prática
jurisprudencial sem espaço para contextualização e reconsideração de precedentes.