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CONCEITO DE ASSÉDIO MORAL ORGANIZACIONAL: OS DIREITOS FUNDAMENTAIS AO TRABALHO,
À SAÚDE E AO MEIO AMBIENTE SAUDÁVEL NA TUTELA DA ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO
do trabalho é a base das práticas de assédio e sobretudo do silêncio e da
tolerância para com elas.
Esse é o ponto sintomático que se considera o mais importante para
combater e prevenir o assédio: é indispensável compreender e transformar
as condições que permitem que as vítimas de condutas abusivas diretas não
possam contar com a reação de solidariedade e a resistência dos coletivos de
trabalho aos quais elas pertencem. Como, uma vez mais, ressalta Dejours,
o assédio no trabalho não é algo novo. Se hoje multiplicam-se as vítimas, é
em razão do isolamento que se instaura como consequência da deslealdade
no mundo do trabalho. O que há de novo é a solitude de não poder contar
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com a solidariedade, a ajuda, o testemunho, a reação dos outros colegas .
Os demais percebem a violência. Mas, o que faz com que esses colegas se
recolham e fiquem na posição de cúmplices por omissão? De uma violência
que no futuro pode atingi-los! E mais, que, a partir daí, tenham de se
justificar defensivamente, por sua cumplicidade. Uma pesquisa feita pelo
parlamento da Itália, com vistas à aprovação da autorização de ratificação da
184 Convenção 190 da OIT, constatou que 81% das pessoas entrevistadas que
já tinham sido vítimas de assédio no trabalho não falaram com ninguém no
local de trabalho a respeito do ocorrido e que menos de 1% delas denunciou
o incidente à polícia. Em outro levantamento com abrangência global,
patrocinado pela OIT, identificou-se que apenas 55% das pessoas vítimas de
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assédio ou violência haviam comentado com alguém a situação . Portanto,
o assédio e outras formas de violência se alimentam, de um lado, da cultura
do desempenho. Mas também, de outro lado, nutrem-se da degradação da
cooperação e da solidariedade entre as pessoas que trabalham na organização
e que são fruto das opções de gestão internalizadas pela empresa ou
organização ao promoverem a competição, o individualismo, ao obstruírem
o livre diálogo e deliberação sobre o trabalho real, ao romperem o vínculo
com os valores e o sentido ético e técnico do trabalho bem-feito. Tudo isso
integra um ideário, um conjunto de práticas e um sistema de dispositivos
de poder e aparatos tecnológicos que compõem de forma generalizada a
16 Id. Ce qu’il y a de meilleur en nous, op. cit., p. 113-114.
17 ILO. Experiences of violence and harassment at work: A global first survey. y, Geneva:
ILO, 2022. Disponível em: <https://www.ilo.org/sites/default/files/wcmsp5/groups/public/@
dgreports/@dcomm/documents/publication/wcms_863095.pdf>.