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SOBRE ANTÍDOTOS E VENENOS: AS METAS E O ADOECIMENTO DOS TRABALHADORES,
OU COMO A COBRANÇA DE METAS TEM AFETADO ATÉ MESMO A SAÚDE DOS JUÍZES E SERVIDORES
INTRODUÇÃO
De há muito se tem afirmado que a reestruturação produtiva,
com a supressão dos chamados “tempos mortos” e o estímulo ao aumento
da produtividade sobretudo pela exigência de metas, ao tempo em que
proporciona ganho de eficiência empresarial, também provoca um risco
infinitamente maior de adoecimentos dos trabalhadores, tanto de ordem física
quanto de natureza psíquica. E, de uns tempos até esta parte, o serviço
público tem se esforçado também para alcançar níveis de excelência em
termos de “produtividade”, tanto que a eficiência passou a ser mais que uma
característica a ser exigida dos servidores públicos brasileiros, tendo sido
alçada a verdadeiro princípio da Administração pública, ex vi do art. 37 da
CRFB (EC n. 19/1998). Especialmente a partir de 2008-2010, com base
nas políticas implementadas pelo Conselho Nacional de Justiça, adotaram-
se no Poder Judiciário brasileiro as lógicas e ferramentas da metodologia
“Balanced scorecard” (BSC), concebida originalmente pelos professores
Robert S. Kaplan e David Norton (Harvard Business School) . Este é o
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objeto do presente artigo: (re)pensar, criticamente, os modelos de metas de
produtividade, no imo da iniciativa privada e, também, no serviço público,
ainda que em primeiras aproximações.
Bem se sabe, desde a medicina de Paracelso (1493-1541), que
a diferença essencial entre o fármaco e o veneno reside na respectiva
concentração. Afinal, os modelos de metas em geral – e o BSC em específico
– são o remédio ou o veneno? Voltamos a Paracelso: tudo depende da “dose”.
E do viés. Eis, para agora e adiante, a direção do nosso trajeto.
Assim dito, cabe desde logo um necessário registro: jamais
defenderíamos, por evidente, a ideia de que trabalhadores em geral
e servidores públicos pudessem prestar seus serviços do modo e com a
agilidade que melhor lhes aprouvesse, sem compromissos com a empresa,
a instituição e/ou a comunidade. No caso do serviço público, a expressão
já o diz: há que servir ao público, sempre. E a exigibilidade de eficiência
de todo e qualquer servidor, inclusive do Poder Judiciário, por si só, é
plenamente justificável.
3 KAPLAN, Robert S.; NORTON, David P. The Balanced Scorecard: Translating strategy into
action. Boston: Harvard Business Review Press, 1996, passim.