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REFLEXÕES SOBRE O COMBATE À VIOLÊNCIA DE GÊNERO NAS RELAÇÕES DE TRABALHO
À LUZ DA CONVENÇÃO N. 190 E DA LEI N. 14.457/22
entre o desenvolvimento da atividade econômica e a vontade da pessoa do
trabalhador, ocorra certa instrumentalização do último para o fim almejado
pela empresa – existindo, sim, um grau de desumanização do trabalhador
no interior do sistema produtivo.
Os sistemas fordistas e tayloristas de produção, a título de exemplo,
não raro reduzem o trabalhador a peças de engrenagem, sujeitas ao poder
dos gestores e ao ritmo das máquinas, imersas em ideologias que favorecem o
abuso do corpo físico, a competitividade, a individualidade e o rompimento
das relações sociais, dentre outros danos.
Nesse norte, a doutrina de Clara Maria T. R. :
6
Mascarada como uma cobrança de produção e resultados, a violência
é banalizada e faz parte da gestão, por isso, comumente, usa-se o
termo “institucionalização” da violência, e sendo assim, permanece
um ciclo institucional entre líderes e liderados, impulsionados pela
prática da violência, uns violentando no comando e outros aceitando
as práticas de tratamento degradante, levados pela necessidade e
dependência econômica ou até mesmo, acreditando que a violência
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deva fazer parte do ambiente de trabalho.
Desde 1943, a Consolidação das Leis do Trabalho reconhece
a possibilidade de resistência do trabalhador à violência, inclusive moral
quando, no seu artigo 483, consigna que o trabalhador está autorizado a
rescindir indiretamente o contrato de trabalho nos casos em que forem
exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons
costumes, ou alheios ao contrato; quando for tratado pelo empregador ou por
seus superiores hierárquicos com rigor excessivo; e correr perigo manifesto
de mal considerável; praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou
pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama; o empregador ou seus
prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria
ou de outrem; ou o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou
tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.
As hipóteses que autorizam a rescisão indireta se justificam, assim,
pelo abuso do poder empregatício sobre a pessoa do trabalhador, prevendo
6 Rodrigues, Clara Maria Teles. Violência laboral: Estudo comparativo entre as legislações
trabalhistas brasileira e argentina. Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/artigos/
violencia-laboral/550359078>. Acesso em: 29 maio 2024.