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S. Tavares-Pereira

              o objeto virtual descrito e definido, com fins teóricos e práticos. Afinal,
              como se mesclam o trabalho humano e a nova criação tecnológica designada
              paradigmaticamente, neste paper, como metaverso? Identificadas, explicitadas
              e descritas as relações nele presentes, ou que nele se desenvolvam, poder-se-á
              afirmar o quê?

                       Talvez se possa afirmar: (i) apenas a existência de um novo
              instrumento/ferramenta de exploração do labor humano ou (ii) apenas
              o surgimento de um inovador ambiente de trabalho ou, ainda, (iii) o
              estabelecimento de um novo ente fenomênico que é, ao mesmo tempo,
              instrumento e ambiente de trabalho.

                       A tecnologia é uma mutante permanente, tem bases e fundamentos
              estranhos aos juristas e, diante do movediço, tudo se complexifica. Os passados
              do Direito ajudam pouco na tarefa de entendimento do novo ente. Muitas
              vezes, de fato, os passados atrapalham. São obstáculos epistemológicos
              expressivos a serem superados e que, como afirma Bachelard, “[...] não se
              trata de considerar obstáculos externos, como a complexidade e a fugacidade
              dos fenômenos”, porque é “[...] no âmago do próprio ato de conhecer    269
              que aparecem [...] lentidões e conflitos. É aí que mostraremos causas de
              estagnação e até de regressão, detectaremos causas de inércia às quais
              daremos o nome de obstáculos epistemológicos” . [grifo nosso]
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                       A resistência dos  paradigmas multiplica a dificuldade porque,
              diz a argúcia de Piscitelli, “entre los objetivos de la ciência normal no se
              encuentra el de ‘fabricar’ nuevos fenómenos incompatibles con el paradigma
              dominante” , ou, como enfaticamente realça Kuhn, deve firmar-se uma
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              “consciência da anomalia” de que as expectativas paradigmáticas da ciência
              foram quebradas e de que a teoria do paradigma precisa ser ajustada,
              trabalho que só termina quando “[...] o anômalo se tenha convertido no
              esperado” . A primeira regra metodológica posta por Bruno Latour em
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              37  BACHELARD, Gaston. A formação do espírito científico. Trad. Estela dos Santos Abreu.
              Rio de Janeiro: Contraponto, 1996. p. 17.
              38  PISCITELLI, Alejandro.  Ciencia en movimento. La construcción social de los hechos
              científicos (I). 3.ed. Tucumán: Centro Editor de América Latina S.A., 1993. p. 132.
              39  KUHN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. 5. ed. São Paulo: Perspectiva,
              1997. p. 78.
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                                           Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 12  Região | v.27 n. 36 2024
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